Disciplina HDL5042 – Epistemologias Negras: Clássicos da Resistência

Docentes:  Diego dos Santos Reis; Maria Angélica Souza Ribeiro; Paulo Daniel Elias Farah; Rosangela Aparecida Hilario; Renato Brunassi Santos

Início: 16/08/2023

Dia da semana: quarta-feira

Horário: 19h00 às 23h00

Formato: À distância

Nº de Créditos: 06

Período de Inscrições:

Aluno Regular

Pré-matrícula: 03 a 09 de julho de 2023

Sistema Janus https://uspdigital.usp.br/janus/comum/entrada.jsf

Aluno Especial e Alunos UNESP e UNICAMP

Período de inscrição: 03 a 09 de julho de 2023

https://ppghdl.fflch.usp.br/form/aluno-especial

PROGRAMA

Ementa

A disciplina se propõe a analisar as interlocuções entre as escrevivências e a produção teórica de intelectuais que se constituíram, bem como a sua produção, às margens. Propõe-se a analisar ainda os impactos do movimento negro na constituição das epistemologias pretas. O feminino e o feminismo negro: memórias, protagonismos e resistências. O aquilombamento como estratégia para acesso e permanência na academia. Saberes e sabores de preta: a cultura da periferia fortalecendo a academia. A estética da sensibilidade: casa de preto-lugar de Bamba, todo mundo canta, estuda e avança. Espaços e lugares das pretitudes. Língua, linguagens e o pretoguês: muitas palavras e pouco entendimento.

Objetivos

O objetivo geral é colocar em pauta destacada a contribuição da intelectualidade negra, a partir de suas escrevivências e das epistemologias não presentes no cotidiano de produção acadêmica eurocentrada, dando protagonismo à produção que não apenas fortaleceu o ativismo mas também contribuiu no desenvolvimento de política pública, legislação de combate ao racismo e discriminação e reconhecimento dos saberes produzidos em espaços para além das Universidades e laboratórios. Saberes esses que eram usurpados e ressignificados por conceitos, teorias e metodologias que foram criados a partir do renascimento na Europa, mas que já existiam em países africanos como Egito, Nigéria, Marrocos, Benim e Tunísia, entre outros.

A intenção é possibilitar uma lente de análise com múltiplos enfoques e tendo como provocadores os vários fenômenos que se enredam na constituição destas intelectuais, transformam sua existência em corpo político, avançam um pouco a cada geração e permitem que várias pessoas se fortaleçam nos/com seus escritos.

A ideia é propor referências que possam dialogar com existências e produzir conhecimento que se ajuste a todas as pessoas, principalmente aos corpos que estão ocupando universidades como a USP e precisam de representatividade para se sentir pertencentes.

Objetivos Específicos:

  • Avaliar o impacto das temáticas e proposições da intelectualidade negra nas pós-graduandas;
  • Investigar a existência de outras disciplinas com o referencial organizado majoritariamente por intelectuais negros/negras;
  • Promover uma proposta de educação antirracista que contribua para o combate ao racismo religioso e ao apagamento histórico e promova a valorização da cultura e das vivências da cultura Negra;
  • Compreender o feminismo negro como um movimento social importante para possibilitar a inclusão de fato de todas as pessoas e o reconhecimento das estratégias criadas pelas mulheres negras para avançar na ocupação de espaço de poder.

Justificativa

A decolonização do pensamento urge para devolver aos lugares de reconhecimento, visibilidade e destaque pessoas que fizeram história e usaram o conhecimento ancestral como estratégia para avançar na busca do combate a várias intolerâncias como a xenofobia, o racismo em todas as suas manifestações, a transfobia, a LGTQIA+fobia e todas as formas de discriminação contra existências de que se tem pouco conhecimento. A marca que orienta a organização destas epistemologias se estrutura sobre as vivências traduzidas por meio de um processo inspirado na etnografia, na busca da compreensão, entendimento e multiplicação destes saberes, bem como a ousadia e o arrojo do pensamento coletivo a favor daqueles que a história oficial gostaria que fossem invisíveis.

Tendo como marco temporal a (des)abolição da escravatura e os marcos legais que foram construídos em torno do processo que impedia ao povo manifestar sua fé (cuja alternativa será o sincretismo), possuir terras, ir à escola e, pior, que fez com crianças recém-nascidas pretas já nascessem com uma dívida a ser “sanada” por meio do trabalho sem remuneração até os vinte e um anos deixou como herança ao povo preto brasileiro um legado de miséria, injustiças, ausências e descaso do Estado brasileiro e abandono.

Nesta perspectiva, a proposta desta disciplina é refletir como o feminismo negro - suas intelectuais e a potência de suas produções - impactou e contribuiu para que políticas como as cotas reverberassem a favor da ocupação de espaços antes negados e interditados. É interesse da disciplina também refletir coletivamente sobre como o processo de aquilombamento, com inspiração em Beatriz Nascimento e Abdias Nascimento, tem sido estratégia eficiente para fortalecer acadêmicos e acadêmicas e dar sustentação à permanência.

A fim de decolonizar o pensamento, é intenção da disciplina introduzir as feministas que estão fora das referências bibliográficas das feministas brancas em função do desconhecimento de suas associações teóricas e constituição acadêmica intelectual: árabes, muçulmanas, palestinas, africanas.

Em um momento importante para a ressignificação dos espaços de poder e reconhecimento da academia, quando as tradições de abuso e violência da produção fordista na academia estão sendo colocadas em xeque, é preciso que passemos a refletir para além dos espaços eurocêntricos de produção de conhecimento e nos comprometamos a dar voz e vez a intelectuais que cartografaram a resistência, abriram espaços e produziram a partir de suas escrevivências.

Conteúdo

Aula 01

Epistemologias Negras: entre a notoriedade e o apagamento

Tereza Santos: O carnaval como espaço de fortalecimento da identidade cultural negra

Sueli Carneiro: Enegrecer o feminismo e feminilizar o movimento negro

Aula 02

Processo de constituição e resistência das identidades negras na academia

Helena Theodoro: O candomblé como referência hierárquica do matriarcado africano

Marina Mello: Registros, memórias e histórias da (des)abolição

Aula 03

Quilombo como unidade administrativa e aquilombamento como processo de resistência

Beatriz Nascimento: Aquilombar para avançar

Abdias Nascimento: O conceito de aquilombamento à luz da contemporaneidade

Aula 04

As infâncias pretas: quem pode ser criança na escola de educação básica?

Eliane Cavalleiro: Educação antirracista para quem?

Petronilha Beatriz: Criança branca pode ser racista?

Aula 05

As identidades mulheris pretas e periféricas: as muitas maneiras de ser mulher no mundo

Elaine Nascimento: Interseccionalidade e violação de direitos das mulheres pretas e lésbicas

Jonas Alves: Você vai se arrepender de levantar a mão para mim

Aula 06

Enegrecer o movimento feminista e feminilizar o movimento negro

Marcia Lima: qual o lugar da mulher preta na política

Lélia Gonzalez: O convite para a festa brega exige silenciamento

Aula 07

Mulheres que não estão em referenciais de produção científica do Norte Global, como as egípcias Nawal El-Saadawi (1931-2021) e Mona Helmi (1958-), a marroquina Fatima Mernissi (1940-2015) e a tunisiana Moufida Tlati (1947-2021).

Aula 08

A pedagogia da transgressão: contribuições de bell hooks para uma inclusão de fato

bell hooks: Como a afetividade e a transgressão precisam pautar ações pedagógicas para as crianças pretas

Carla Akotirene: Como a interseccionalidade pauta o não-lugar das mulheres pretas

Aula 09

O feminino e o feminismo negro na academia: memórias, protagonismos e resistências

Angela Davis: Memórias de tornar-se preta e resistente

Audre Lorde: A solidão da mulher preta

Aula 10

O protagonismo das mulheres negras na organização de uma educação antirracista

Giovana Xavier: Preta nada básica

Soujorner Truth: Não seremos, pretas, mulheres

Avaliação

A avaliação será desenvolvida de forma processual e contínua, com base nos seguintes critérios: participação em sala de aula, autonomia nos estudos individuais e produção de ensaios e relatórios. Assim as avaliações seguirão a seguinte organização:

1) Avaliação formal (AF), resultado de um momento formal e específico: Leitura, sistematização e apresentação de textos baseados na bibliografia. O aluno deverá entregar no mínimo 10 comentários do texto e/ou filmes apresentados nas aulas (30% da nota final).

2) Apresentação da pesquisa desenvolvida na Pós-Graduação e proposta de articulação e interlocução com o referencial apresentado (30% da nota final).

3) Escolha de uma temática relacionada à disciplina e apresentação de um projeto nas múltiplas linguagens possíveis de serem convertidas as leituras (40% da nota final)

Bibliografia Básica

CARNEIRO, Sueli. Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero. Racismos contemporâneos. Rio de Janeiro: Takano Editora, v. 49, p. 49-58, 2003.

DAVIS, Angela. Estarão as prisões obsoletas? Tradução: Marina Vargas. 2ª edição, Rio de Janeiro: Difel, 2018.

GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo Afro |Latino-Americano: Discursos, ensaios e conferências/organização de Flávia Rios, Marcia Lima - 1ª ed Rio de Janeiro: Zahar, 2020.

HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir. A educação como prática de liberdade. Tradução de Marcelo Brandão Cippola. - 2ª edição: São Paulo, 2017.

MERNISSI, Fatima. The veil and male elite: a feminist interpretation of women’s rights in Islam. New York: Basic books, 1991.

RIBEIRO, Matilde. "Mulheres negras: uma trajetória de criatividade, determinação e organização." Revista Estudos Feministas 16 (2008): 987-1004.

SAADAWI, Nawal El. A Face Oculta da Eva. São Paulo, Global, 2002.

SAADAWI, Nawal El. Nawal El Saadawai: ‘Do you feel you are liberated? I feel I am not’. 11 out 2015. Entrevista concedida a Raquel Cooke. Disponível em: https://www.theguardian.com/books/2015/oct/11/nawal-el-saadawi-intervie…; Acesso em: 19 abr 2023.

SISLER, Peter F. For Tunisian Filmaker Moufida Tlatli Living in silence is...United Press International, Washignton, 9 mai 1995. Disponível em: https://www.upi.com/Archives/1995/05/09/For-Tunisian-filmmaker-Moufida-…. Acesso em: 19 abr 2023.

THEODORO, Helena. Guerreiras do Samba. Textos escolhidos de cultura e artes populares. Rio de Janeiro, v.6, número 01. P.223-236, 2009.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

CESAIRE, Aimé. Discurso sobre o colonialismo. Tradução de Claudio Willer. São Paulo, 2020.

DO NASCIMENTO, Abdias. Quilombo: vida, problemas e aspirações do negro. Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo, 2003.

WOODSON, Carter G. A deseducação do negro. São Paulo: Medu Neter, 2018.

VERGÈS, Françoise. Um feminismo decolonial. Ubu Editora, 2020.

SOMÉ, Sobonfu. The spirit of intimacy: Ancient African teachings in the ways of relationships. Sobonfu Some, 1997.

Artigos em periódicos

ANZALDÚA, Gloria. Falando em línguas: uma carta para as mulheres escritoras do terceiro mundo. Revista Estudos Feministas, v. 8, n. 01, p. 229-236, 2000.

DA SILVA JUNIOR, Jonas Alves. Um canto de resistência: imagens do desfile da Mangueira de 2019 em diálogo com a educação. REMEA-Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, v. 37, n. 2, p. 368-387, 2020

DE ALMEIDA MELLO, Marina Pereira. Em busca da justiça cognitiva: leituras e leitoras para um processo de escolarização decolonial. Impulso, v. 28, n. 72, p. 23-32.

FARAH, Paulo Daniel. Deleite do estrangeiro em tudo o que é espantoso e maravilhoso: estudo de um relato de viagem bagdali. Rio de Janeiro, Argel, Caracas: Edições BibliASPA, Fundação Biblioteca Nacional, Bibliothèque Nationale d’Algérie e Biblioteca Nacional de Caracas. 2007.

________________. “Combates à xenofobia, ao racismo e a intolerâncias em encontros entre refugiados e brasileiros e em programas educativos de idiomas e culturas”. São Paulo: REVISTA USP, v. 114, 2017.

GUIMARÃES, Valdenia; MENEGON, Silva; ALVES, Lígia Emanuela Costa. GIRA DE ESTUDOS AFRICANOS E AFRICANIDADES E A FORMAÇÃO NA UNEGRO/CAXIAS. Revista Práxis Pedagógica, v. 6, n. 7, p. 152-169, 2021.

HILÁRIO, Rosangela Aparecida. O Feminismo Negro como estratégia para assunção de direitos as Mulheres Pretas e Periféricas.Revista_Ensaios_Filosoficos_Volume_XX.pdf (ensaiosfilosoficos.com.br).

HILÁRIO, Rosangela Aparecida. SOUZA, Vinicius dos Santos. INTERSECCIONALIDADE, EDUCAÇÃO E REPRESENTATIVIDADE: O IMPACTO DE RAÇA E GÊNERO NO PERCURSO ACADÊMICO Revista Interinstitucional Artes de Educar (uerj.br), 2021,

LUSTOSA, Tertuliana. Manifesto traveco-terrorista. Revista Concinnitas, v. 1, n. 28, p. 384-409, 2016.

YORK JR, Sara Wagner; OLIVEIRA, Megg Rayara Gomes; BENEVIDES, Bruna. Travesti Textual (insubmiss) Manifestations. Revista Estudos Feministas, v. 28, n. 3, 2020.

LEAL, Dodi Tavares Borges. Fabulações travestis sobre o fim. Conceição/Conception, v. 10, p. e021002-e021002, 2021.

RIBEIRO, Maria. KELLEN, Jéssica. HILÁRIO, Rosangela Aparecida. Raça como casta, raça como potência: a força da ciência no combate a discriminação racial. Nexo, 2023.

TRAVESTI, Florence Belladonna; DA SILVA JÚNIOR, Jonas Alves. SOBRE DIABOS, VIADOS E BICHAS PRETAS NA EDUCAÇÃO. Revista Interinstitucional Artes de Educar, v. 7, n. 3, p. 1732-1737, 2021.

Documentários e curta-metragem

Vista a minha pele. Brasil. 2011 https://www.youtube.com/watch?v=m7rLDHeIK3k

STJ 44- Encarceramento feminino. 2018 https://www.youtube.com/watch?v=JcM8eMtyXTg

A solidão da mulher negra. Programa Sai Justa. 2018. https://www.youtube.com/watch?v=9NZPgVzrOTU

Flávia Pinto fala do RACISMO e MACHISMO contra as religiões de origem africana Sexta Black https://www.youtube.com/watch?v=4VebtxejcAM

#LegítimaDiferença | Mulheridades e Feminilidades Trans, com Onika Bibiana: https://www.youtube.com/watch?v=Hqcygvpl7zY

CLIPES

Cesária Evora

Angola (Official Video)

https://www.youtube.com/watch?v=ky5yjog0O0k

Clementina de Jesus

Não vadeia Clementina

https://www.youtube.com/watch?v=HI7-AYGLsqc

Elza Soares

A carne

Maria da Vila Matilde

A Mulher do fim do mundo

Ivone Lara

Canto de rainha

https://www.youtube.com/watch?v=4K17ERwSK7Q

Liniker

Zero

Mel Duarte

Não desiste negra, não desiste

Preta Rara

Audácia

Fotografias

Amazônia Negra- Marcela Bonfim

FILME

Moufida Tlatli

O silêncio dos palácios (1994)